Em março de 2013, o jornalista Fábio Gusmão (foto) percebeu o Whatsapp como uma importante ferramenta para a redação do Extra

O que começou com uma simples observação de como as pessoas passaram a interagir com seus smartphones culminou com a criação de um novo conceito, chamado hiperproximidade. Em março de 2013, o jornalista Fábio Gusmão, editor online do Jornal Extra, percebeu que o potencial do Whatsapp iria muito além da simples troca de mensagens entre amigos e familiares. Além de textos, o fato de o aplicativo poder compartilhar fotos e vídeos fez acender em Gusmão uma luz. Foi a partir deste insight, que ele notou o grande potencial jornalístico que essa ferramenta proporcionaria à redação do Extra.

Até aquele momento, a estratégia era considerada inédita no mercado brasileiro. Em junho daquele ano, após cerca de três meses das primeiras observações e estudos de Gusmão, o jornal passou a estampar em suas páginas um novo canal para denúncias dos leitores: o Whatsapp do Extra. De lá para cá, os números só comprovaram que a percepção do jornalista tinha fundamento. Atualmente, o Whatsapp do jornal Extra, que em 2015 foi finalista no Digital Média Awards Latinoamerica, da Wan-Ifra, conta com mais de 70 mil contatos inscritos do Brasil e do mundo, contribuindo (até a data de veiculação dessa entrevista) para a publicação de cerca de 3.800 reportagens nas versões impressa e online.

Desde a criação do Whatsapp do Extra, foram trocadas mais de seis milhões de mensagens com os leitores, que enviaram nada menos do que 120 mil fotos, seis mil vídeos e 15.800 áudios. Confira abaixo a entrevista com o jornalista Fábio Gusmão para entender um pouco mais sobre como surgiu essa estratégia.

Como você percebeu que o Whatsapp poderia ser uma eficiente ferramenta estratégica para a redação do jornal Extra? Como foi esse insight?
Gusmão: Comecei a observar o comportamento das pessoas nas ruas, no shopping e depois de quem estava próximo a mim. E percebi que estavam interagindo de forma diferente com seus smartphones. Lembro da cena em um shopping do Rio, quando um grupo de pessoas andava, lado a lado, digitando freneticamente em seus celulares. Fiquei curioso. O comportamento mudava do uso de um polegar só, movimento sempre visto para quem dá scrolls em redes sociais como Facebook e Twitter, alternando com menos frenquência com o movimento de digitar.

Isso me chamou atenção e fui pesquisar, perguntando às pessoas como estavam usando. E todos falavam que era o WhatsApp. Comecei a fazer entrevistas com todos mais próximos a mim e fui vendo como usavam. Comecei a ver o que tinha no aplicativo: havia envio de foto, texto e formação de grupos, além de vídeo. Eles ainda não haviam liberado o recurso de áudio. E pensei: tem tudo aqui para a produção jornalística. Minhas entrevistas comprovavam que as pessoas já usavam para compartilhar vídeos, fotos, notícias… aí pensei: por que não falar para as pessoas que poderiam falar com a gente por ali? Foi assim… tudo começou em uma contemplação do ser humano.

Fale um pouco sobre a equipe que gerencia o Whatsapp do Extra? São quantas pessoas, quais as suas funções e como elas se revezam?
Gusmão: Temos duas pessoas, uma pela manhã e outra na parte da tarde. E a noite fica com a escuta digital. Funcionamos até meia-noite. A ordem é responder todas as pessoas e cadastrar todas. Todo mundo é importante para nós.

Como as mídias recebidas são gerenciadas?
Gusmão: Checamos cada uma, selecionamos por urgência e importância e encaminhamos para a editoria correspondente gerenciar e apurar mais detalhes. Depois, o material multimídia é enviado para a edição e posterior publicação no site e/ou nas redes sociais.

Como é feita a triagem das denúncias que chegam pelo aplicativo? O que vale, ou não, enviar para a equipe de redação? Como isso é avaliado?
Gusmão: Os critérios jornalísticos não mudaram: urgência, relevância, abrangência… a equipe recebe a mesma orientação de sempre.

Como as informações são checadas? Inicialmente, esse trabalho fica a cargo do pessoal que gerencia a ferramenta, ou é exclusivo dos repórteres?
Gusmão: A equipe que recebe faz as primeiras perguntas para ter um pouco mais de detalhes. Depois, o material é enviado para as chefias da editoria correspondente. Assim, a apuração é aprofundada. O material só é publicado após uma apuração rigorosa.

Como é a comunicação do jornal com os usuários do Whatsapp? A equipe do jornal envia periodicamente mensagens, ou realiza campanhas, para estimular a participação dos leitores?
Gusmão: Enviamos noticiário para alguns grupos de pessoas. Mas não para a base toda. Em geral, o caminho é sempre mais do leitor para nós.

Como administrar mais de 70mil contatos no Whatsapp do Extra? Qual estratégia é adotada para isso?
Gusmão: Não é tão complicado. Criei uma plataforma específica para isso. E nem todos falam com a gente ao mesmo tempo.

Pelas nossas contas, sua equipe administra cerca de 1.400 grupos. Como lidar com isso? Os grupos são divididos por tema?
Gusmão: Não trabalhamos mais com estratégia de grupos. Isso não é eficiente. Só em casos e ações específicas, como fizemos nos dois últimos Rock in Rio.

No caso do jornal Extra, como estabelecer uma atenção tão direta e imediata com cada leitor no Whatsapp?
Gusmão: Chamamos desde o início de hiperproximidade. Somos íntimos do leitor. Estamos a três toques deles. Eles têm nosso número de celular. Isso é a melhor relação que qualquer pessoa pode ter com outra. Imagine uma marca com seu público? É confiança, é a sensação de pertencimento, de poder colaborar. Isso estimula o que há de melhor em cada pessoa que faz contato com a gente.

Como vocês trabalham com o Whatsapp no computador? Usam o recurso nativo do aplicativo para web, ou algum tipo específico de programa foi instalado?
Gusmão: No início, nós usamos um emulador Android para gerenciar e facilitar o contato. Não usamos a versão web do WhatsApp, pois ela tem recursos limitados.